quarta-feira, 30 de novembro de 2022

Último poema.

ÚLTIMO POEMA DATADO DE RICARDO REIS

Vivem em nós inúmeros;  
Se penso ou sinto, ignoro  
Quem é que pensa ou sente.  
Sou somente o lugar  
Onde se sente ou pensa.  

Tenho mais almas que uma.  
Há mais eus do que eu mesmo.  
Existo todavia  
Indiferente a todos.  
Faço-os calar: eu falo. 

 
Os impulsos cruzados  
Do que sinto ou não sinto  
Disputam em quem sou.  
Ignoro-os. Nada ditam  
A quem me sei: eu escrevo. 

*

13-11-1935

Ricardo Reis

In Ricardo Reis. Poesia. edição de Manuela Parreira da Silva. Assírio & Alvim. 2.ª* edição, junho de 2007.

Imagem: Mário Botas - Mapa da Sepultura do Poeta

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